O tema pode parecer off-topic por fugir da bike, mas como meu objetivo principal sempre foi o de contribuir para uma mudança social e a bicicleta não passou de uma ferramenta para esse fim, acredito que posso usar o canal para esse fim. Quero usar esse texto para acrescentar aqui um pouco mais sobre esse vídeo desabafo, como tinha muito barulho ambiente, coloquei legenda. Fui ao Allianz Park no dia 27 de agosto de 2017 para ver meu Verdão. Vamos deixar de lado esse clubismo estúpido, aqui não é uma simples questão de violência no futebol, mas debater essa sociedade violenta que vivemos.

Sou Avanti 5 estrelas e para chegar nesse rating não precisamos necessariamente comprar o plano mais caro, mas sim comparecer ao maior número de jogos. O sistema é tão bom que em alguns meses meu custo por ingresso chega a 30 reais por partida, ou seja, nenhum absurdo. A vantagem de atingir o rating de 5 estrelas é entrar na primeira compra de ingressos e consequentemente escolher os melhores lugares. No anel superior, os mais cobiçados são os da primeira fileira e só depois de 5 meses, finalmente atingi a tão sonhada 5ª estrela que me deu o direito de escolher o meu lugar.

Resumindo (muito) o que narrei no vídeo, fui ao Allianz Parque, quando cheguei no meu lugar, havia uma galera lá. Tinha comprado 3 ingressos, para mim, para minha mulher e um para meu filho. Apesar da bagunça na numeração, quem estava no meu lugar sabia que tinha dono, mas tentou dar uma de “esperto”. A partir de então chamei o pessoal do estádio para intervir, mas os “espertos”, passaram a me ofender, ameaçando me agredir caso insistisse em exercer meu “direito”.

Quando vi que a coisa iria ficar feia, ameacei chamar a polícia e para minha surpresa, a mulher que estava no meu lugar ERA UMA PM, DEU ATÉ UMA CARTEIRADA EM MIM!

Dedo na cara, cuspidas, ofensas, ameaças de porrada, isso tudo na frente do funcionário do Allianz. Mesmo assim queria muito pagar para ver até onde aqueles animais eram capazes de ir, correndo enorme risco de linchamento. Por fim, a solução encontrada pelos funcionários do Allianz, não foi retirar de lá os agressores, mas me colocar em outro lugar no estádio.

Como um bom ativista que não consegue ficar calado contra QUALQUER tipo de injustiça, não queria aceitar a oferta e meu desejo era insistir que o Palmeiras garantisse o meu direito, mas eu não estava só e por causa da minha mulher acabei aceitando a proposta. Arrumaram até um lugar melhor, mais caro, dessa vez rodeado por pessoas civilizadas. Assisti um jogo que até poderia marcar minha vida pelos belos gols, mas marcou pela violência que sofri e pela enorme falta de esperança na humanidade que me assolou com toda a situação.

Poxa, não venham com esse papo de que você é mais torcedor do que eu. Jamais irei tentar comparar o sentimento para com o meu time com o de outra pessoa, mas não aceito que alguém se julgue mais torcedor do que eu e pior, ache que por isso, tem mais direitos que eu.

Meu bisavô, um engenheiro Italiano que veio ao Brasil para trabalhar na construção das linhas férreas de São Paulo, naturalmente se tornou palmeirense. Meu avô continuou palmeirense e passou a paixão para meu pai. Eu virei palmeirense devido ao amor que tenho pelo meu pai e sabia que isso nos aproximaria, tanto é que consigo me ver criança, com cerca de 8 anos, ao lado dele num porão em casa onde ele trabalhava com suas traquitanas, ouvindo os jogos do Palmeiras no radinho de pilha, ao som do José Silvério.

Lembro a dificuldade de compreender quem estava com a bola e só ouvir o Gol. Aí começava a angustia, um grito que durava séculos, até que finalmente vinha a frase que tanto esperava… Duuu Paaaalllmeeeeeeiraaaaass… Tá, as vezes era outro time, mas faz parte.

Meu pai não ia ao estádio ver os jogos do Verdão, mas por incrível que pareça, minha primeira experiência num estádio foi com ele e num jogo, acreditem, do SÃO PAULO. Explicando, meu pai fazia bico de bilheteiro em dias de jogos no Morumbi e algumas vezes levava eu ou meu irmão Carlos aos jogos, que assistíamos das numeradas atrás dos gols, sempre a vista do meu pai.

Ficava eu lá quietinho, prestando atenção no jogo, tentando entender o que estava acontecendo. Vale lembrar que não havia Gameboy ou Celular para nos distrairmos na época. Nem me pergunte com quem o São Paulo jogou naquele dia, um gol com certeza teve e acho que terminou 2 a 0, mas o mais importante ali foi passar algumas horas com meu pai. Portanto aos amigos que tem ojeriza ao futebol, ou mesmo não conseguem compreender essa paixão que algumas pessoas têm pelo esporte ou pelo seu time, acreditem, para a maioria dos torcedores, essa paixão não passa de um bom motivo para estar ou lembrar de alguém que amamos muito.

Cresci, comecei a trabalhar e passei a ir aos jogos com meus amigos Vagnão, o Odair. Foram vários clássicos com o Morumbi dividido meio a meio com Corinthians, São Paulo. Naquela época já tinha muita violência, mas como bom brasileiro a gente aprende “técnicas de sobrevivência” não né? No estádio é tudo bem dividido, cada torcida chegava por um lado, mas na volta para casa quando o bicho pegava, era só esconder a camiseta e passar desapercebido pelos animais uniformizados.

Mas a atmosfera do estádio contagia, nem sempre os amigos Palmeirenses (que não eram tantos assim) estavam disponíveis e o que fazer? Passei a ir nos jogos sozinho, mas vamos combinar, é muito chato. Então passei a chamar os amigos que torciam para outros times, assim levei pro estádio Corintianos como o Feijão, meus irmãos São Paulinos Fábio e Duca e sempre foi muito divertido.

Se meus irmãos mais novos (São Paulinos) me agraciaram com suas companhias, porque não retribuir levando eles (adolescentes na época) para ver seu São Paulo ser campeão da Libertadores? Fiz isso com o maior prazer e acredito que até hoje eles se lembram da experiência.

Também fui com meus amigos Cadu e Zenga ver, porque não, um jogo do Corinthians? Fui logo na estreia do Tevez e também foi muito louco assistir um jogo no meio da torcida do Corinthians. Claro que a princípio torcia para que o Corinthians fosse goleado, mas fiquei feliz em ver meus amigos contentes e agradecido pela oportunidade única. Confesso que no final do jogo estava até torcendo junto com eles. Me recuso a ser irracional como algumas pessoas que se dizem torcedores, que jamais teriam admitido terem torcido para outro time que não o de coração. O fato de eu ter torcido para outros times em alguns momentos, jamais diminuiu minha paixão pelo meu time.

Depois de muito tempo afastado do estádio, inspirado pelo lindo estádio que meu Palmeiras construiu, voltei a ir a jogos e minha principal motivação foi fazer minha mulher carioca (que se dizia flamenguista) me fazer companhia no estádio e ainda mais virar palmeirense. Como é bom colocarmos a camisa do Verdão e irmos juntos para o estádio, comer um pernil na barraquinha como fazia há vinte anos atrás, gritarmos juntos, agarrar ela a cada gol e participar de uma festa fantástica, até nas derrotas a experiência com ela era maravilhosa. São coisas assim que fortalecem um relacionamento e fazem aumentar ainda mais o amor entre duas pessoas.

Os saudosistas que me desculpem, mas é muito mais gostoso ver um jogo nas novas arenas, principalmente no Allianz, já que não conheço ainda os novos (ou reformados) estádios do Brasil. Cadeira demarcada, ótima visão do campo de qualquer lugar, não preciso mais de uma luneta para ver um gol, como precisei para ver aquele maravilhoso gol das chapeletas que o Alex fez naquele 4 x 2 no São Paulo. De onde estava só conseguia ver a bola subindo uma vez, duas vezes e comemorar quando metade do estádio explodiu.

Eu e minha mulher adoramos viajar e logo ela pediu para leva-la a jogos do Verdão até mesmo em outros estados… E agora José? Uma coisa é ver um jogo na minha cidade, junto com minha torcida, outra é ir a uma cidade desconhecida e ficar sujeito a enfrentar esses marginais que existem em todas as torcidas (inclusive na minha). Eu até encararia a situação, pra quem já pedalou no meio de território de onças no Pantanal, seria só mais um desafio que poderia (ou não) trazer consequências mais graves, mas expor outra pessoa a essa situação perigosa é complicado.

Se eu já tinha medo de leva-la para um jogo onde somos minoria, imagina depois de domingo quando quase fui linchado pela minha própria torcida? Mas porque temos que aceitar que o fato de ir ao estádio, ver seu time de coração tem que ser perigoso? Porque temos que continuar tentando sobreviver a selvageria e não lutar para que ela tenha fim?

A resposta é simples, a maioria dos brasileiros (acho que os humanos em geral) preferem fugir de qualquer tipo de enfrentamento, por mais certo que eles estejam. E sabemos que os que enfrentam sempre levam a pior, até porque os contestadores quase nunca têm amparo do estado. Porque as mulheres dificilmente fazem queixas contra homens que cometem abusos? Porque todos sabemos que a maioria dos abusadores irá se vingar e as autoridades nada farão para proteger as vítimas.

Desde que me conheço por gente, o estado brasileiro como um todo sempre optou por soluções fáceis, torcida única, escolta aos agressores (e não das vítimas), sem falar da hipocrisia que rola nos anúncios de soluções, como as penas que impedem que os agressores assistam um jogo sabendo que nem capacidade de fazer esse controle eles possuem. Se o estado (incluindo aí a Polícia) enfrentassem os agressores de forma séria, punindo-os e protegendo as pessoas que são “realmente de bem”, a situação seria muito diferente.

Aliás a PM passa a impressão que só crime grande que importa, mas qualquer pessoa que já foi pai na vida sabe que “é de pequeno que se desentorta o pepino”. Se a PM fosse rígida com as pequenas infrações, seja jogar lixo na rua, desrespeito a faixa de pedestres, intolerância as pequenas corrupções diárias, todos os infratores costumazes viveriam numa espécie de estado vigilante e pensariam duas vezes antes de cometer uma infração, como por exemplo, sentar no lugar de outra pessoa.

Essa história de que a pessoa tem que fazer o certo por questões de civilidade é balela. Qualquer sociedade que hoje tem como característica a honestidade coletiva, um dia foi muito rigorosa com os pequenos delitos. Só depois de muitas gerações eles se deram conta que é muito melhor viver num mundo onde todos respeitam as regras do que num mundo onde o jeitinho impera (Vai Brasil!).

Por isso que temos que combater atitudes como a de um certo prefeito que pra agradar infratores, aumentou as velocidades e diminuiu a fiscalização no trânsito, dizendo que tem que o correto é investir em educação. O resultado todos podem ver, o aumento de mortes dos mais fracos, como vem ocorrendo atualmente em São Paulo.

Para encerrar, vai ser triste ter que ver meu Verdão só pela TV com minha mulher, deixar de aproveitar uma viagem a mais só por causa do medo da violência. Para piorar, estou vivendo um momento complicado na relação do meu filho e da mesma maneira que um dia usei o futebol para me aproximar do meu pai, poderia tentar fazer o mesmo com ele, mas sinto que situações como as que ocorreram recentemente, quando o levei para o estádio não devem mais acontecer. Triste essa sensação de impotência, mas fazer o que?

André Pasqualini