Primeiro me desculpem pela ausência no blog, pois precisava desses dias desconectado. Falando sobre o último trecho pedalado, minha saga começou tarde, estava em São João da Aliança a 150 quilômetros de Brasília, não queria sair tarde mas o cansaço falou mais alto. Por fim saí as 10 da manhã de lá e morrendo de medo de ser obrigado a pedalar de noite em Brasília, uma cidade muito inóspita para quem não tem carro, principalmente para quem esta chegando na cidade.
Na saída da cidade passei na Sport Bike, aquela loja do Outdoor. No dia anterior havia conhecido e conversado com o Gleison Rodrigues, dono da loja. Achei muito interessante a sua “luta”, a de mostrar para as pessoas que a bicicleta não é só transporte, mas é também lazer, esporte e principalmente saúde. Tenho certeza que muitos cicloativistas de cidades grandes vão rir ao ler esse parágrafo.
Voltando ao pedal, saí com as pernas bem cansadas e na tentativa insana de chegar antes do anoitecer em Brasília. No começo alguns trechos planos, algumas colinas nem tão íngremes. Nas retas até conseguia manter 25 km/h, mas devido ao cansaço, não conseguia pedalar mais que 8 km/h nas subidas que eram poucas mas estavam lá.
Depois de São Gabriel, foram 80 kms mas peguei longos trechos planos onde conseguia desenvolver 25 km/h o que fez eu chegar rapidamente no Distrito Federal, cruzando a divisa do estado com sobra de tempo para o por do sol.
Na estrada o complicado era a velocidade dos carros. Tocantins foi o estado onde os motoristas eram bem mais tranquilos, sempre há aqueles que correm demais, mas proporcionalmente ali eram menos. Já em Goiás e quanto mais me aproximava de Brasília, a coisa ia ficando feia.
Quando cruzei a divisa do estado de Goiás com o DF começou a patifaria. A pista não estava esburacada mas muito remendada e para os motoristas poderem socar a bota, praticamente todos andavam pelo acostamento, sempre em altíssima velocidade, numa pista onde a velocidade máxima é de 80 km/h. Imaginem o meu cagaço de ser atropelado no acostamento depois de uma curva. Tirei várias fotos e depois até parei de tirar, mais fácil fotografar quem andava da forma correta pois eram raros.
Brasília quase não tem avenidas, eles tem rodovias cruzando a cidade. Entrei numa dessas rodovias onde o asfalto era um tapete e o acostamento bem ruim, mas nem por isso entrei na pista dos carros.
Depois de 10 kms descendo, comecei uma longa subida e para a minha surpresa o acostamento sumiu, bem na subida.
Mas na esquerda havia um acostamento, então atravessei a pista e segui pelo outro lado até Sobradinho.
Quando estava numa rodovia para acessar o plano piloto, o acostamento sumiu. Calçada também não existe e encarei uma ladeira a mais de 60 km/h. Nesse momento um motoqueiro começou a me escoltar. Queria pegar uma via para sair numa paralela a Asa Norte, mais tranquila, mas ele acabou me largando no meio do eixão. Foi tenso, lá os carros correm demais e com esforço consegui sair de lá e seguir pelas ruas internas.
Cheguei na Rodoviária de onde temos uma visão privilegiada da Esplanada dos Ministérios e do Congresso Nacional.
Passei o final de semana em Brasília, onde revi meus amigos, curtimos a cidade, andamos de metro, mas sempre naquelas. Brasília é uma cidade feita para os carros, pessimamente planejada, nem calçadas decentes ela tem. Uma cidade segregacionista, onde a maioria dos que moram aqui não tem raízes com a cidade. Planejada para deixar os mais pobres mais afastados dos mais ricos.
Espaço há mas não há vontade política de incentivar as pessoas usarem outros meios de locomoção que não seja o automóvel.
O Metro é bom, mas como em São Paulo, não atende todo mundo, apenas regiões mais ricas, onde estão sendo criados vários canteiros de obras ao redor. Ele poderia ser maior mas foi feito para atender uma baixa demanda. O lado bom é que a bike é liberada no Metro todos os dias e sempre que usei vi mais ciclistas dentro dos vagões e sem trazer problemas para os demais usuários.
Amanhã deixo Brasília, minha intenção é pedalar até Paracatu a mais de 200 kms daqui. Se conseguir chegar em Cristalina até o meio dia, metade do caminho, encaro a viagem até a cidade mineira. Hoje estou apenas a 867 kms de São Paulo. A cada dia pedalado a distância diminui. A saudade só aumenta e o trabalho é controlar a ansiedade. Estou conseguindo, pois estou me sentindo melhor e louco de vontade de chegar logo em Sampa para arregaçar as mangas, pois terei muito trabalho a fazer nessa minha nova vida.
Grande André!
Muito do que vc falou sobre o trânsito de Brasília é a mais pura verdade! Mas também acabou cometendo algumas injustiças ao longo do seu texto… É preciso ser mais cuidadoso nos seus julgamentos.
1- A cidade acaba de completar 50 anos! Como vc quer que as pessoas tenham grandes raízes?! Apesar disso, muitos dos que nasceram, cresceram ou se mudaram para Brasília criam um vínculo único com a cidade, que está começando agora a mostrar uma cara própria, com muita cultura e diversidade.
2- Brasília não foi planejada para deixar os mais pobres mais afastados dos mais ricos! Ao contrário, ela foi planejada com uma perspectiva igualitarista (alguns diriam socialista). No entanto, sabemos que as coisas não saíram bem como planejado. Mas há uma graaande diferença nisso!
3- O metrô não atende regiões mais ricas… ele atende as cidades satélites, para trazer a população mais pobre que trabalha no centro e deixar as ruas livres para os ricos e a classe média. Os trens ficam lotados em horários de pico. Seria ótimo se o metrô chegasse até a população mais rica de Brasília. Isso seria um grande incentivo para deixar o carro em casa e conhecer a cidade com seus próprios pés, como todo mundo!
Então, o que é preciso fazer é continuar trabalhando para que os espaços públicos da cidade sejam ocupados de forma mais democrática. O que vc ignorou no seu post é o lado positivo de Brasília, que talvez seja, no Brasil, uma das cidades com maior potencial para se implementar um plano de mobilidade fantástico. Ainda estamos a anos luz do ideal, mas realmente não é nada complicado adaptar a cidade ao uso da bicicleta e desenvolver um transporte público eficiente.
Parabéns pela sua viagem incrível e espero que tenha chegado em SP com muita energia para rodar ainda muitos kilômetros!
Abraços,
Jonas
Vamos lá Jonas, eu disse “A maioria” das pessoas não tem raizes na cidade. Eu mesmo tenho vários amigos lá e acho que nenhum nasceu em Brasília. Raiz é ter história, gerações e isso vamos convir, impossível numa cidade com menos de 50 anos. Vale lembrar que ela começou a ser construída a 50 anos e demorou muito tempo para ela ficar realmente habitável e criar uma massa populacional.
Sobre criar vínculo com a cidade, realmente isso está começando a acontecer agora, mas mesmo assim ainda não é com a maioria da população, pode ser que isso ocorra nas cidades satélites, local que eu passei pouco tempo, mas no Plano Piloto é a minoria que tem esse vínculo necessário para que o povo passe a valorizar a cidade que vive.
O que eu saiba dos planejamento de Brasília foi a criação do Plano Piloto e das cidades satélites que ficariam a cerca de 20 kms do plano, ligadas por rodovias. Se isso é uma perspectiva igualitária ou socialista, meu conceito de socialismo não tem nada a ver com isso.
Os planos em geral sempre são bons, o problema é a execução. O plano de Águas Claras é ótimo no papel, mas na execução temos apenas obras de apartamentos, shoppings e nada de aparelhos públicos. Fiquei até sabendo que há uma certa pressão velada de moradores de Águas Claras para que não seja construída uma escola pública na região para que pessoas de baixa renda não venham estudar lá. Se isso é verdade? Não sei, mas conhecendo esse nosso povinho medíocre, não duvido.
Sobre o Metrô, vamos combinar que ambos estão errado. O Metrô de Brasília tem uma única linha que vai da Rodoviária até Águas Claras e de lá se divide em duas, uma para Ceilandia e outra para Samambaia, passando pela Asa Sul.
Dá Rodoviária até Águas Claras podemos dizer que o Metro atende a classe média alta e depois uma classe média que não para de aumentar o seu poder aquisitivo. Mas ele foi mal dimensionado, tem plataformas pequenas, trens só com 3 portas e é muito demorado para ter um padrão de Metro. Eu mesmo sempre tinha que esperar, no mínimo 5 minutos para um trem chegar e nos finais de semana sei que essa espera chega a meia hora, além de encerrarem muito cedo a operação. Ele é bom mas tem muito o que melhorar.
Realmente Brasília tem tudo para que seja realizado um bom plano de mobilidade com ciclovias, transporte público decente, calçadas, mas será que é isso que seu povo quer? Será que o Brasiliense vai querer perder o espaço de estacionamento nos gramados para dar lugar a calçadas, ciclovias ou áreas de lazer?
Não creio que a maioria dos Brasilienses querem isso, tanto é que nos poucos dias que eu estive aí o novo governador do DF só visitava obras de novas rodovias. Apesar de saber que Brasília tem um potencial gigantesco para dar um exemplo para o Brasil (e o mundo) de plano de mobilidade, eu duvido que isso ocorra em menos de 20 anos, tempo que eu acho necessário para que os carros ocupem todos os espaços possíveis, travando de vez essa cidade.
Abraços
André Pasqualini
André!
Eu te via mais como um sonhador, um cara mais positivo. Estou surpreso com seu pessimismo! 20 anos?!
Vc acha que na Dinamarca a idéia de fechar as ruas para os carros foi bem aceita logo de cara?! Vc não tem acompanhado a experiência de Bogotá?! É claro que não dá para esperar a boa vontade do brasiliense comum, assim como os projetos que tiveram sucesso não esperaram pela boa vontade do dinamarques nem dos colombianos… não é uma questão de prazo para as pessoas aceitarem e entenderem. se houver vontade política, isso pode ser feito agora, a qualquer momento.
Abração!
Jonas
p.s. O Distrito Federal não é uma cidade. Quando se fala da Brasília planejada, considera-se o plano piloto, incluindo o lago sul e norte, o cruzeiro e algumas outras áreas centrais (o famoso desenho do avião). Não se está falando de todo o Distrito Federal. Esse planejamento foi feito numa perspectiva igualitarista/socialista, de forma que as áreas residenciais são muito semelhantes, oferencendo, em teoria, acesso semelhante aos espaços públicos para todos os habitantes. De fato, poucos tem acesso a esta cidade, que se tornou uma espécie de “ilha da fantasia”. Por outro lado, nada impediria que as cidades satélites tivessem certa autonomia, vida e dinâmica própria independentemente de estarem perto do plano piloto – mas isso é outra questão.
Grande André,
Você é muito forte!
Te admiro muito.
Fico feliz por vc ter recuperado o bom ânimo pois quem pedala sabe o quanto custa levantar todo dia, dia após dia, e saber que tem que pedalar muito.
Força no pedal.
Estamos ligados e desejando força e saúde.
Felicidades.
Grande André.
Me sinto um privilegiado em te acompanhar desde o 1º km de seu projeto, e termos brindado juntos um de seus 1ºs destinos.
Brasília não nos surpreende, é a terra do poder tupiniquim, jocosamente falando.
Em um país que adora se vangloriar por bater recordes de produção automobilística, difícil esperarmos “moleza” de uma política excencialmente rodoviarista e você com certeza passou por constrangimentos desnecessários ao longo de sua jornada, além de pedalar sob intensa pressão de “monstroristas”.
Nesses últimos kms, espero que você tenha toda a proteção que merece, que suas pernas respondam com Alegria ao seu chamado e que quando estiver chegando, seu rosto estampe o sorriso de quem se permitiu e… venceu.
Parabéns Amigão.
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